Dos 13 presidenciáveis, 4 mal chegaram a citar o termo “mulher” em seus planos de governo e apenas 5 apresentam propostas concretas em relação a elas

As mulheres, que formam 52,5% do eleitorado brasileiro, têm chamado a atenção nas estatísticas deste ano por um motivo: a alta taxa de indecisão das eleitoras. Em um país em que as mulheres são subrepresentadas na política institucional e nos espaços de tomada de decisões, os candidatos têm tido fracasso em conquistar a confiança das eleitoras. Um terço delas ainda não tem o voto definido.

Segundo a pesquisa Datafolha divulgada antes do atentado ao candidato Jair Bolsonaro, em um cenário sem o ex-presidente Lula, 34% das das mulheres não encontraram um candidato. Os números da indecisão são inéditos considerando os últimos 30 anos.

Já na mais recente pesquisa divulgada pelo instituto, após o atentado contra Bolsonaro, o número de indecisos caiu, mas as mulheres ainda lideram esse grupo. Segundo o Datafolha, 18% delas pretende votar nulo ou banco e 11% ainda não sabe em quem votar. Esse último grupo ainda aumentou, eram 9% na última pesquisa.

O cenário torna precioso o voto das mulheres, ainda mais levando em conta que, sem Lula, não há um favorito disparado. Conforme outubro se aproxima, esse eleitorado torna-se cada vez mais disputado: tradicionalmente elas decidem mais tarde. Mais da metade do eleitorado feminino (51%) admite que ainda pode mudar de ideia.

Exemplo da disputa desse público é a tentativa crescimento de Marina nos últimos debates. O confronto entre ela e Bolsonaro no evento promovido pela RedeTV! mostrou que Marina tem apostado cada vez mais no eleitorado que ainda não escolheu seu voto, ponto fraco do candidato do PSL. Segundo o Datafolha, 49% das mulheres não votariam ‘de jeito nenhum’ em Bolsonaro.

“Só uma pessoa que não sabe o que é ganhar um salário menor do que um homem tendo as mesmas capacidades, as mesmas competências, e ser a primeira a ser demitida é quem sabe”, afirmou ela. Marina citou também a cena em que o candidato foi fotografado ensinando uma criança a fazer o gesto de arma.

Com o início da propaganda eleitoral na televisão, na semana passada, foi a vez de Alckmin tentar disputar o eleitorado feminino que ainda não se decidiu. Dono do maior tempo de campanha eleitoral na televisão, Alckmin veiculou uma propaganda com cenas em que Bolsonaro ofende e xinga uma jornalista e a deputada Maria do Rosário. “Você gostaria de ser tratada desse jeito?”, indaga a propaganda às eleitoras.

CartaCapital analisou as propostas referentes à população feminina nos planos e diretrizes de governo divulgados no site DivulgaCandContas, do TSE. Dos 13 presidenciáveis, 4 mal chegaram a citar o termo “mulher” em seus planos de governo e apenas 5 apresentam propostas concretas em relação a elas.

Os assuntos mais polêmicos – e também mais caros às mulheres – não estão em grande parte dos textos dos candidatos mais cotados nas últimas pesquisas para vencer as eleições. O aborto, por exemplo, não não consta nos programas de governo de nenhum dos 5 primeiros colocados na última pesquisa do Datafolha. Já o feminicídio só aparece em 2 deles.

O que dizem os programas de governo?

Os candidatos Álvaro Dias (Podemos)Cabo Paciolo (Patriota)José Maria Eymael (DC) e João Amoêdo (Novo)  não citam a palavra “mulher” em seus planos de governo.

Desses, a referência mais próxima às mulheres é feita pelo candidato Cabo Daciolo. Ele cita o aborto, mas para afirmar sua posição contrária. “Não é possível conceber que a família em seus moldes naturais seja destruída, que a ideologia de gênero e a tese de legalização do aborto sejam disseminadas em nossa sociedade como algo normal”, afirma.

Jair Bolsonaro (PSL), que tanto se refere às mulheres em entrevistas e debates, com atitudes misóginas e machistas, e que tem no eleitorado feminino a maior taxa de rejeição, só cita a palavra “mulher” uma vez em seu plano de governo, ao falar sobre estupro.

Ele, que já negou mais de uma vez a existência da cultura do estupro e de casos que se enquadram como crime de feminicídio, propõe como meta ao combate ao estupro. Desconhecedor das origens desse problema, ele propõe como formas de impedir a violência sexual, entre outras, “prender e deixar preso” e “reformular o Estatuto do Desarmamento”. O candidato também faz uma alusão às mulheres em outra passagem do texto, em que ele cita como objetivo “a saúde bucal e o bem estar da gestante”.

Já os candidatos Geraldo Alckmin (PSDB) e Henrique Meirelles (MDB) usam a palavra “mulher” em ambos os textos apenas duas vezes. Alckmin fala de um “pacto estadual de diminuição da violência contra a mulher”, em um programa de governo enxuto e genérico, de apenas nove páginas. Meirelles cita, como meta, o incentivo à redução da diferença salarial entre homens e mulheres.

Vera Lúcia (PSTU) Guilherme Boulos (PSOL) são os únicos candidatos com programas de governo que defendem abertamente o aborto livre, público e gratuito. A candidata do PSTU também defende o combate a todo tipo de violência à mulher e mecanismos de igualdade de direitos e salários, mas não explica como atingir esses objetivos, em um curto programa.

Já o programa de Boulos é o que mais cita a palavra “mulher”: 125 vezes. Mas é também o programa mais longo, com 228 páginas. Boulos, que tem como vice uma líder indígena, Sônia Guajajara, é um dos programas que mais trata a mulher de forma interseccional. O texto fala de minorias como indígenas, negras e mulheres LGBTI+.

Ele apresenta 23 propostas centrais em relação às mulheres e esmiúça cada uma delas. Entre elas estão medidas para a redução da desigualdade no mundo do trabalho, a universalização do acesso a creches, implantação da Política de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PAISM) e de projetos de atenção à saúde mental das mulheres, desenvolvimento de programas de educação e prevenção sexual, efetivação da Política Nacional de Saúde da População Negra.

Com relação à violência, o plano defende a criação de “Pacto Nacional contra a Violência e pela Vida das Mulheres”, com diversas medidas para o combate à violência, a tipificação do feminicídio de travestis e transsexuais, um programa feminista de formação para profissionais dos serviços públicos, a discussão de gênero nas escolas e a criação de espaços para atendimento e acolhimento de mulheres egressas do sistema prisional.

Diferente de todos os outros programas de governo, o texto da chapa de Boulos inclui travestis e transsexuais nas propostas às mulheres. O texto defende para essa população políticas de formação e emprego, tratamento profissional adequado e respeitoso no serviço de saúde e atendimento público humanizado para pessoas desse grupo que se encontrem em situação de vulnerabilidade.

A candidata Marina Silva (PV), em suas diretrizes de governo, defende a ampliação de políticas de prevenção da violência, a qualificação do atendimento às vítimas e o combate ao feminicídio.

Marina também propõe políticas para enfrentar a discriminação no mercado de trabalho, como a igualdade salarial, a ampliação da participação de mulheres em posições de tomadas de decisões, o estímulo ao empreendedorismo, a ampliação de vagas em creches em período integral e do tempo de licença-paternidade.

Segundo o texto, seu governo pretende promover “ações de saúde integral das mulheres”, por meio dos tratamentos preventivos, estímulo ao parto humanizado e atendimento à gravidez na adolescência, com uma “política integrada das áreas de educação e saúde”.

A presidenciável não cita a questão do aborto no texto. Mas, em recente sabatina, ela reafirmou ser contra, mas afirmou que, caso seja eleita, há a possibilidade de um plebiscito sobre o tema.

No plano de governo lançado pelo PT, que agora tem a frente Fernando Haddad (PT), o texto fala da promoção de “políticas para as mulheres visando a igualdade de gênero” e da “adoção de uma perspectiva inclusiva, não-sexista e sem discriminação na educação e demais políticas públicas”. O plano de governo também dá atenção à interseccionalidade, incluindo mulheres negras, LGBTI+, indígenas, etc.

O texto também coloca como diretrizes a ampliação do valor e do tempo do seguro-desemprego para as gestantes, a atenção aos direitos sexuais e reprodutivos, com foco na saúde sexual. Na temática violência, fala-se da integração e ampliação dos serviços e medidas preventivas de proteção e de atenção, como a Casa da Mulher Brasileira e Lei Maria da Penha, e as promovidas pelo enfrentamento ao feminicídio.

Entre as metas divulgadas estão a paridade de gênero na política, a recriação da pasta de Políticas para as Mulheres com status de ministério, a isonomia salarial, o estímulo à produção das mulheres na ciência e na tecnologia, políticas afirmativas para mulheres no campo da cultura, ampliação de vagas em creches e titularidade prioritária às mulheres nos lotes dos assentamentos nos programas de reforma agrária, meta que também aparece no plano de João Goulart Filho (PPL).

O programa do PPL também tem como objetivos erradicar a superexploração do trabalho da mulher, o “pagamento de salário igual para trabalho igual”, a ampliação da licença maternidade e das vagas em tempo integral nas creches e a criação de dispositivos para a redução da carga de trabalho que recai sobre as mulheres. Goulart também cita o aborto e coloca como meta sua descriminalização. Propõe também a ampliação do acesso a meios anticoncepcionais e o combate à violência contra a mulher.

Entre as medidas presentes em seu programa de Ciro Gomes (PDT) estão igualar o número de homens e mulheres nas posições de comando na política, atuar junto aos órgãos competentes para garantir a segurança das candidatas e eleitas, recriar a Secretaria de Mulheres, garantir acesso igual das mulheres ao mercado de trabalho, na seguridade social, aumentar o número de vagas disponíveis em creches e ampliar o acesso das mulheres à educação.

O texto também cita a criação de programas que ajudem a proteger as trabalhadoras informais, a igualdade de salários de homens e mulheres quando na mesma função e a proibição de práticas discriminatórias por empregadores.

Em relação à saúde, o texto propõe ações de prevenção em relação à saúde sexual e reprodutiva, a garantia de recursos para a interrupção da gravidez apenas quando ocorrer de forma legal e combate à violência obstétrica, com humanização do parto.

Com relação à violência, o programa tem como diretrizes aplicação das leis já vigentes, políticas públicas de proteção e apoio, e enfrentamento das violências cometidas contra as mulheres encarceradas. (fonte: Carta Capital)

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