O Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento (ONDAS) acredita que a aprovação do PL 4.162, de 2019, na noite de 24 de junho, não contribuirá para o avanço do saneamento básico no Brasil, como querem fazer crer os defensores da proposta. Aliás, nos últimos meses, assistimos a uma verdadeira campanha de desinformação que, baseada no diagnóstico dos déficits na prestação dos serviços, apontou para a privatização como a solução para todos os males.
O ONDAS parte do princípio de que o acesso à água e ao esgotamento sanitário é um direito humano fundamental e, sendo assim, acredita que a proposta pode criar um monopólio do setor privado nesses serviços essenciais, o que não contribuirá com a tão propalada universalização do acesso. Isso porque as áreas mais carentes desses serviços encontram-se nos pequenos municípios, nas áreas rurais e nas periferias das grandes cidades, áreas onde residem populações com baixa capacidade de pagamento dos serviços, portanto, incompatível com a necessidade de lucro almejado pelas empresas privadas e por seus acionistas.
Um déficit com essas características, que é retrato das profundas desigualdades sociais e econômicas da sociedade brasileira, não será equacionado pelo aumento da participação privada na prestação desses serviços. Mas, sim, por políticas públicas integradas que considerem as diferentes dimensões do déficit, conforme já caracterizado no Plano Nacional de Saneamento Básico (PLANSAB), e que aumentem o comprometimento do setor público com a oferta de serviços universalizados, acessíveis a todos(as), de qualidade e geridos de forma eficiente.
O argumento de mudança da Lei atual (11.445/2007) não se sustenta. A Lei é relativamente nova, foi regulamentada em 2010, e o PLANSAB, em 2013. Tempo curto, considerando que a área de saneamento foi historicamente negligenciada por sucessivos governos e que passou a ocupar papel de destaque há pouco tempo, com a criação do então Ministério das Cidades, da retomada dos investimentos e do planejamento.
O ONDAS, baseado nas avaliações de diversos especialistas e na experiência nacional e internacional, entende que as opções desastradas para as quais o projeto de lei ontem aprovado aponta embutem um grave risco de desestruturar a prestação atual, sem nenhuma garantia de que melhores serviços serão prestados. O quadro catastrófico do saneamento básico de Manaus, quase vinte anos após a privatização de seus serviços públicos de água e esgoto, bem caracteriza os riscos de que falamos.
Acreditamos que a saída para a universalização do acesso aos serviços é a garantia de recursos perenes de financiamento, seja por meio de empréstimos (CEF e BNDES) ou de Recursos do Orçamento Geral da União (OGU) – sempre com profundo controle dos investimentos por parte da sociedade. Também defendemos a criação de um fundo para universalização do acesso, como já ocorre em outros setores, como o de energia, e um programa de revitalização e fortalecimento para as empresas públicas e autarquias. Seria necessário, ainda, a efetiva implementação da Lei 11.445/2007 com seus vários instrumentos, bem como do PLANSAB, além da criação de programas de apoio aos pequenos municípios na elaboração de seu plano de saneamento básico, entre outras medidas.
Enfim, defendemos que a garantia de água e esgotamento sanitário para todos(as) só será possível com o fortalecimento do papel do Estado e com a efetiva participação e controle por parte da sociedade. Reconhecemos que muito há de se avançar no saneamento, mas o remédio proposto no PL é para “matar o doente” e não para recuperá-lo.
Coordenação Geral
ONDAS – Observatório Nacional dos Direitos à Água e ao Saneamento