A Cidade do Cabo (África do Sul) está, nos próximos meses, a debater-se com uma gravíssima crise de falta de água. Na cidade, as reservas só chegam para cerca de quatro meses e, a manter-se a ausência de chuva, em maio as torneiras vão secar.
A água passará então a ser distribuída aos cidadãos, 25 litros a cada. Atualmente, mesmo não se tendo atingido esse extremo, o racionamento contempla uns meros 50 litros por pessoa – o que, para a maioria das pessoas em outros países, não chegaria sequer para o banho diário.
Por comparação, um morador de São Paulo, por exemplo, utiliza em média 187,97 litros por dia, enquanto, para a ONU (Organização das Nações Unidas), 110 litros de água por dia são suficientes para atender as necessidade básicas de uma pessoa.
Na cidade onde outrora a água era abundante, resta apenas um magro curso hídrico cercado de uma paisagem árida.
Conflitos serão inevitáveis
Desligar o sistema de distribuição significa não ter água saindo da torneira de casa para realizar tarefas simples e essenciais, como tomar banho, dar descarga no banheiro e cozinhar. Temendo um acirramento da tensão social em face da gravidade da crise, a África do Sul usará suas forças militares para proteger o abastecimento de água e evitar conflitos.
A extrema escassez de água na cidade reflete três anos consecutivos de seca, associados a um boom populacional e a divisões políticas. Entre 1995 e 2018, a população da Cidade do Cabo aumentou cerca de 80%. Durante o mesmo período, a capacidade de armazenamento das barragens aumentou apenas 15%.
Os esforços pela eficiência no uso da água vistos na cidade, porém, não ecoaram no campo. Conforme observa o pesquisador David W. Olivier, do Instituto de Pesquisa de Mudanças Globais da Universidade de Witwatersrand, as cidades não têm o poder de fazer alocações de água para a agricultura. Isso é feito pelo governo nacional.
Na contramão das iniciativas de prevenção e economia adotadas na cidade, “o Departamento Nacional de Água e Saneamento não tomou medidas para reduzir o uso agrícola da água em 2015/2016”, escreve Olivier em análise publicada no site The Conversation. (com informações: Exame e Jornal i)
Como evitar esse cenário?
O futuro perfila-se estranho e contraditório em toda a Terra. Com o aquecimento global e o degelo dos polos, prevê-se a subida do nível da água do mar, ameaçando milhões de pessoas nas cidades costeiras. Em sentido contrário, a escassez crescente de água potável também ameaça populações inteiras, podendo dar origem a conflitos entre nações.
A resposta pode estar em outras perguntas. Enumeramos apenas algumas.
. Como aceitar que as cidades não tenham sistemas de recolha e armazenamento das águas da chuva?
. Como explicar os vazamentos na rede pública de água tratada, que em muitas cidades chegam a casa dos 30%?
. Como setores produtivos dispõem de litros e mais litros de água, que pertende a todos, sem pagar por isso?
. Como explicar que, com tanta tecnologia, em tantos milhares de casas se escoem metros e metros cúbicos de água pura pelo cano abaixo enquanto aquece para o banho?
. Como compreender que, numa sociedade evoluída, se use água potável para a rega, para uma descarga dos sanitários ou para lavar o carro?
FAMA 2018 – Fórum Alternativo Mundial da Água
É preciso agir e procurar soluções agora, de modo a estarmos preparados para quando a escassez se instalar em definitivo.
O FAMA 2018 – Fórum Alternativo Mundial da Água e irá debater essas e outras questões, principalmente no que se refere à privatização e mercantilização da água.
O FAMA será realizado em Brasília, entre os dias 17 e 22 de março. Para participar e saber mais, acesse: www.fama2018.org / Facebook: @FAMA2018 .
A Federação Nacional dos Urbanitários – FNU -, que apoia e integra a coordenação nacional do FAMA 2018, subscreve o Manifesto do Fórum Alternativo Mundial da Água por entender que “água deve estar a serviço dos povos de forma soberana, com distribuição da riqueza e sob controle social legítimo, popular, democrático, comunitário, isento de conflitos de interesses econômicos, garantindo assim justiça e paz para a humanidade”.
Afinal, água é direito, não mercadoria.