O CNE – Coletivo Nacional dos Eletricitários – preparou este resumo (atualizado em fevereiro/2022):
Após aprovação da MP1031/21, que autorizou a privatização da Eletrobras, o Coletivo Nacional dos Eletricitários tem atuado em várias frentes para impedir que o processo aconteça. Do outro lado, o governo acelera os processos e atropela todas as instâncias de fiscalização e controle para entregar a empresa o mais rápido possível ao mercado especulativo.
O processo de privatização está sob análise do TCU. Foi dividido em dias partes, e a primeira delas está em julgamento. Trata das garantias físicas dos empreendimentos que serão descotizados, aumentando estruturalmente o custo da conta de luz. A segunda diz respeito à modelagem propriamente dita, ou seja, como viabilizar a emissão das ações ao mercado financeiro. Para isso, é preciso retirar Eletronuclear e Itaipu do grupo Eletrobras. O TCU ainda não começou a analisar essa segunda etapa. Mesmo assim, sem que o tribunal tenha tomado qualquer decisão sobre o assunto, a Eletrobras convocou Assembleia Geral Extraordinária para o dia 22 de fevereiro, com o objetivo de aprovar a modelagem.
O governo tenta acelerar o cronograma da venda da empresa, porque a avaliação é que isso precisa ocorrer ainda no primeiro semestre, devido ao calendário eleitoral. NO entanto, acreditamos que podemos evitar o processo de privatização da Eletrobras, definitivamente. Para isso, precisamos de apoio de todos movimentos sociais, partidos e parlamentares para denunciar o processo açodado e mal feito por parte dos agentes de mercado que hoje dirigem a empresa.
Em meio a esse processo — e, justamente, devido a ele —, a Eletrobras tem precarizado as relações de trabalho, sucateando e retirando direitos e conquistas de seus funcionários. Depois de alterar as regras do plano de saúde, previsto em ACT, após uma negociação conturbada e em que trabalhadores foram coagidos, em plena pandemia, a empresa acaba de retirar o atendimento à saúde. Isso no momento em que a covid volta a atingir alto índices de contaminação.
Apresentamos aqui os principais pontos de discussão e os problemas na modelagem da privatização da Eletrobras:
ITAIPU
Em 2023, vence o “anexo C” do tratado entre Brasil e Paraguai, sobre a hidrelétrica de Itaipu. Hoje, a energia produzida pela usina e que cabe ao Brasil é vendida a preço de custo, basicamente os custos de operação e manutenção e o custo financeiro do financiamento para a construção da obra. Essa energia é vendida em cotas que cada distribuidora tem obrigação de comprar.
Depois de 2023, a obra estará quitada, e a usina poderá continuar vendendo a energia pelo sistema de cotas, porém a um custo muito mais baixo, beneficiando o consumidor. Ou poderá ser vendida no mercado livre, gerando lucros fabulosos.
Apenas a parte brasileira da UHE Itaipu, vendendo energia a preço de mercado, geraria, no mínimo, uma receita de mais de R$ 7,3 bilhões anuais. Devido a essa indefinição sobre o acordo binacional de Itaipu, não é possível precificar a usina. Portanto, não se pode saber qual a indenização a ser paga à Eletrobras pela perda desse ativo
ELETRONUCLEAR
A lei 14.182 não prevê que a Eletrobras privada será sócia minoritária da Eletronuclear. O governo, porém, o governo está impondo essa condição para a privatização da empresa. Em primeiro lugar, não se pode simplesmente direcionar a participação de uma determinada empresa privada na sociedade em uma estatal, como é o caso da Eletronuclear, sem que haja algum tipo de processo concorrencial, sob pena de infringir o princípio da impessoalidade e da moralidade.
Porque a Eletrobras privada deverá ser a sócia na Eletronuclear e não outra empresa privada qualquer?
Em segundo lugar, caso a Eletrobras privada queira, poderá abandonar a sociedade, deixando todo o programa nuclear brasileiro sem condições econômicas de sobrevivência, a não ser que conte com recursos do Orçamento.
Com a capitalização da Eletrobras, o futuro da Eletronuclear poderá sofrer forte impacto. Um dos grandes problemas é que a captação de recursos se dará pela Eletrobras, que deterá quase que 70% do capital da Eletronuclear. Há o risco de, ao ser privatizada, a Eletrobras se recuse a ficar com a Eletronuclear e não faça a captação dos pelo menos R$ 16 bilhões para terminar a UTN3, além de devolver à ENBPar pela bagatela de R$12,5 bilhões.
A futura corporation que o governo pretende criar com a venda da empresa teria duas opções:
1) Continuar a sociedade com a Eletronuclear, com a maioria das ações PN sem direito a votos, e levantar os R$ 16 bilhões para conclusão da UTN3;
2) Vender a Eletronuclear por R$12,5 bilhões para a ENBPar e não se comprometer com a captação de R$ 16 bilhões para a conclusão da UTN3.
Qual das duas tem maior probabilidade de ser a escolha da iniciativa privada?
Temos que ficar atentos com o risco que se criará para o futuro da energia nuclear no Brasil com a capitalização da Eletrobras, verificando quem vai fazer os aportes futuros para a continuidade do programa nuclear, mesmo que a Eletronuclear gere lucros vultosos à partir de 2028 (8,6% a.a. ref. UTN3).
TCU
O governo e a direção da Eletrobras convocaram Assembleia Geral Extraordinária dos acionistas ara discutir as condições da privatização, sem que estas tenham sido avaliadas pelo TCU. O tribunal sequer emitiu acórdão sobre a primeira etapa do processo, do Valor Adicionado às Concessões, e ainda nem iniciou a análise da segunda etapa, da modelagem da privatização. Trata-se de uma manobra do governo, na tentativa de constranger a Corte a aprovar a privatização nos termos colocados na convocação da AGE — se houver qualquer modificação por parte do TCU, deverá ser convocada outra assembleia.
A convocação da AGE antes da conclusão da análise do TCU retira da Corte sua função de guardiã do interesse público e a relega a mero órgão homologatório das decisões do Poder Executivo.
Fato novo no TCU foi a derrubada do canal, ocorrido no dia 1 de fevereiro, que fez com que o tribunal suspendesse as sessões de julgamentos. Esta questão aguarda ainda desdobramentos.