Com um debate sobre mulheres e o Direito à água, a Escola Superior do Ministério Público da União (ESMPU) promoveu, na na última segunda-feira (5/3), a mesa-redonda “Mulheres e o Direito à Água – violações de direitos no contexto de construção de barragens”. 

Coordenada pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, o debate contou com a participação de mulheres membros dos quatro ramos do MPU e de duas representantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB). “Precisamos tratar da água como direito fundamental. A água é elemento de poder e também de controle de populações e, em geral, os movimentos migratórios são gerados pela falta de água”, destacou a PGR.

Ao apresentar o tema, Raquel Dodge ressaltou que o direito à água é um tema muito feminino, uma vez que as mulheres, em qualquer ambiente civilizatório, são as responsáveis por trazerem água para casa. “A água, que é abundante para fazer funcionar a matriz energética, escasseia para aquelas famílias que foram atingidas e tiveram que se deslocar para outro local. Este é um tema que não entrou na agenda política e de direitos humanos no país”, ressaltou.

Ao dar as boas-vindas ao público que compareceu ao encontro, o diretor-geral João Akira informou que o evento inaugurou o projeto da ESMPU “30 anos da Constituição Cidadã e 70 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos”. “Ao longo deste ano vamos fazer uma série de atividades de extensão para aprofundar o diálogo do MPU com a sociedade”. 

Equidade

Além da PGR, o debate contou com a participação de seis mulheres – quatro do MPU e duas representantes do MAB. Cada uma falou sobre o tema de sua perspectiva profissional e pessoal. Em sua exposição, a subprocuradora-geral do Trabalho Sandra Lia Simón disse que é preciso ter a consciência de que a mulher está sempre presente em todos os momentos da História brasileira, ainda que muitas vezes ela seja ignorada dentro desse seu papel. “A História brasileira oficial e também a da resistência têm padrões dominantes de masculinidade. Por exemplo, todos aqui já ouviram falar em Zumbi dos Palmares, mas poucos já ouviram falar em Acotirene, que foi a primeira líder de Palmares, ou de Dandara, que foi uma negra escrava que lutou ao lado de Zumbi”. 

A importância de se discutir os direitos das mulheres foi destacada pela promotora de Justiça do Distrito Federal e Territórios Luisa de Marillac Xavier dos Passos. Para ela, a Escola inaugurou seu projeto de extensão com dois temas muito sensíveis e o Ministério Público existe para canalizar a voz de todas as minorias. “Nós, como membros do Ministério Público, temos o papel de dialogar com a sociedade. Precisamos perceber as violências sutis de gêneros que a gente vivencia em nosso dia a dia. Temos que ter a bandeira da equidade pois ela perpassa várias outras questões”.

Direito à água

Ao falar sobre o direito à água, a representante do MAB Andréa Neiva enfatizou que é preciso ter a compreensão de que ela é um direito fundamental e não pode ser tratada como mercadoria. “Nós lidamos com pessoas que têm a vida alterada drasticamente pelas definições políticas e econômicas da forma de gerenciamento da água. E isso traz consequência principalmente para as mulheres, que além de todas as violências sofridas, perdem o seu território, a possibilidade de plantar e de pesca ”, relatou.

A promotora de Justiça Militar Najla Nassif Palma, por sua vez, afirmou que “o acesso à água pode ser fontes de deflagração de conflitos armados”. Ressaltou ainda que a inacessibilidade desse recurso deixa a mulher ainda mais vulnerável, pois em muitas localidades é dela a função de buscar água. “Tanto no Congo quanto no Haiti houve situações onde a missão de paz brasileira teve de atuar para garantir a proteção de mulheres, que tinham de caminhar até achar água e durante este trajeto poderiam ser vítimas de violência”, explicou. 

A participação da integrante do MAB Tchenna Fernandes Maso foi marcada pela emoção. Ela leu um texto explicando de forma subjetiva o Movimento dos Atingidos por Barragens, a atuação das mulheres e o trabalho das arpilleras. Em uma das passagens, narrou: “ser mulher atingida é reinventar-se cotidianamente. Refazer os tecidos sociais desfeitos, por isso optamos por bordá-los. São várias as narrativas repetidas sobre linhas e agulhas. Eis que um dia chega a barragem, a violência e a exploração sexual, o despejo e depois é que se para para pensar na política pública e o direito à indenização e ainda bem, bem depois, do que não aparece nas entrelinhas do relatório ambiental, vêm a enchente, a febre amarela, a seca, a crise hídrica”.

Finalizando, a subprocuradora-geral da República Ela Wiecko frisou que mesmo o Direito à água sendo um tema muito feminino, as mulheres não têm qualquer poder de decisão quanto ao local onde vai ser construída uma barragem ou fixado um assentamento; sobre os grandes empreendimentos agroflorestais ou de mineração. “Este é um tema feminino, no qual as mulheres não têm nenhum poder de decisão. Elas são alijadas, não são ouvidas. Temos o compromisso de incorporar essa perspectiva, dar espaço para as mulheres participarem das tomadas de decisões, principalmente naquelas que impactam a vida familiar”, enfatizou.

Programação

A mesa-redonda “Mulheres e o Direito à Água – violações de direitos no contexto de construção de barragens” abriu a exposição “Arpilleras: bordando a resistência”, em cartaz no Hall da ESMPU até 23 de março. As atividades celebram o Dia Internacional da Mulher (8 de março) e o Dia Internacional da Água (22 de março) e foram realizadas em parceria com o MAB. Elas acontecem no momento em que Brasília recebe o Fórum Alternativo Mundial da Água (FAMA), organizado pela sociedade civil, e o ‘Fórum das Corporações’ – autodenominado 8º Fórum Mundial da Água. (fonte: MAB)

Urbanitárias irão às ruas no 8 de março: Água e Energia não são mercadorias!

As urbanitárias engrossam a luta no Dia Internacional da Mulher e irão às ruas neste ano, em especial, para defender o direito à água e a energia para todos.

“As mulheres urbanitárias estão no dia a dia lidando com a questão da água, do saneamento ambiental e da energia nas empresas em que trabalham. As companheiras do setor de saneamento estão bravamente nas frentes de lutas nas entidades sindicais, batalhando contra a privatização das companhias estaduais de saneamento, como forma de preservar a água como um bem público e universal. As companheiras do setor elétrico estão fazendo a resistência contra a privatização do sistema Eletrobras e a entrega do patrimônio nacional à iniciativa privada que só visa lucro”, explica a Secretária da Mulher da FNU, Giovana Barros.

FSM e FAMA 2018

As mulheres urbanitárias estão mobilizadas para participarem de dois grandes fóruns internacionais que acontecem, agora em março, no Brasil.

Entre os dias 13 e 17 de março, em Salvador –BA, acontece o Fórum Social Mundial – FSM – e a Assembleia Mundial de Mulheres terá agenda exclusiva no dia 16 de março. Neste dia será uma oportunidade para as mulheres urbanitárias apresentarem ao mundo a sua pauta de lutas: a defesa da água e da energia como bens públicos, a necessidade de ampliar a participação feminina no mundo sindical, ainda tão marcado pelo domínio masculino, contra o preconceito, contra a reforma da previdência, a necessidade da equidade salarial entre homens e mulheres, dentre outros pontos.

Fórum Alternativo Mundial da Água – FAMA 2018 – que será realizado entre os 17 e 22 de março, em Brasília, também será outro importante espaço para as mulheres urbanitárias fazerem a defesa ao direito à água e ao saneamento e se posicionarem contra a mercantilização da água e sua privatização.

Na noite do dia 20/3 está programada a grande plenária Mulheres e Água.

8 de março será nas ruas!

Vamos à luta, dizer não aos retrocessos, a retirada de direitos, a violência e exigir mais espaço para as mulheres urbanitárias!