Artigo: Lucas Tonaco*
_______________________

O governador Romeu Zema (Novo) anunciou recentemente medidas para proteger os produtores de leite em Minas Gerais, a principal delas é o aumento da alíquota de ICMS para importadores de leite em pó para 18%. Cartazes e campanhas publicitárias para organizar o “Minas Grita Pelo Leite” culminaram em evento realizado com forte presença do setor e do lobby, inclusive organizado pela Federação da Agricultura e Pecuária de Minas Gerais (Faemg). Dadas as circunstâncias da guerra da Ucrânia, a pandemia, e a reordenação das cadeias produtivas e logísticas mediante outros fatores, fizeram com que as importações advindas da Argentina do leite, fosse especialmente mais “lucrativa” e tal medida de Zema visa reduzir a competitividade do leite importado e beneficiar os produtores locais, que representam mais de 220 mil micro e pequenos produtores no estado.

Contradição “liberal”, protecionismo e Estado: estado para quem? De qual tamanho? E como?

Minas Gerais é o maior produtor de leite do Brasil, com 9,5 bilhões de litros (27% da produção nacional, e a medida do governo busca garantir renda e empregos no campo e a complexidade econômica, o aumento do ICMS para 18% visa tornar o leite importado menos competitivo, incentivando o consumo do produto local, também reforço das cooperativas, porém, a questão extremamente contraditória passa por três pontos, a começar que Zema declarou publicamente que seria liberal ou pelo menos em posições de ideologia econômica em que o Estado não advenha em seu protecionismo, e nesse liberalismo de mercado , os estímulos à concorrência irrestrita dos players com o Estado não interferindo e não é a primeira vez em que isso é contraditório, isenções de impostos para a Localiza ao mesmo passo de aumento de impostos em produtos como cerveja e  também ração, denotam que em regra não se segue uma ortodoxia ou heterodoxia no modelo de administração pública, porém, sim, um casuísmo pragmático: o lobby dos produtores leitores, remonta as elites agrárias primário-extrativistas, onde não obstante basta ver o mapa de beneficiários da medida ao passo que comparar com a votação de Zema, deixa-se explicito que além da geopolítica mineira e o fisiologismo do poder, também as teses de Caio Prado Jr. e também  Raymundo Faoro sobre a peculariedade do capitalismo brasileiro (ou em outroras das teses do feudalismo-capitalismo), produto circunstâncias condicionadas a questões históricas oriundas da colonização, elites econômicas e estrutura produtiva, e até mesmo das raízes do Brasil, para ficar em Sérgio Buarque de Hollanda e suas questões agrárias profundas e da “modernidade” – sendo assim, o agro(pecuária) é tec(pecuária), agro(pecuária) é pop, agro(pecuária) é tudo, agro(pecuária) nesse tudo é principalmente lobby, a se ver inclusive das relações da extrema-direita com a agropecuária – isenções, desmatamentos, modelo produtivo primário-extrativista e incentivos.

Outro ponto da contradição, é que a medida parece assertiva no ponto protecionista de um determinado setor, principalmente para a defesa de empregos, mas que para além do pseudo-keynesianismo-zemista, o que é uma contradição em si, Zema ao aumentar impostos de produtos como cerveja, celulares, fraldas e ração – que compõe também o setor industrial e econômico mineiro – Zema tenha deixado de lado o aumento de imposto a produtos de luxo, fazendo assim um injustiça tributária, o que reflete na desigualdade. O último, e mais importante nessa contradição entre protecionismo do leite, é a contradição com relação a relação com as empresas estatais, especialmente a COPASA e a água.

Não adianta taxar o leite derramado e dividir lucros extraordinários da água

Ao mesmo passo que o governo Zema cria uma barreira de importação para proteger o leite em Minas Gerais, a COPASA, teve recordes de pagamento de dividendos extraordinários na gestão do governo Zema, para relativizar os números só em Copasa (CSMG3) aprovou, só no dia 28 de dezembro de 2023 pagamento de R$ 372,5 milhões em dividendos, o que é maior do que todo o volume de importações de leite, US$ 62,6 milhões do ano todo, isso sem a atual importação, que seria apenas 18% desse valor. A COPASA,  que com sua configuração atual do capital acionário, do seu total de 380.253.069, os 338 acionistas estrangeiros (minoritários), detêm 114.904.278 de ações, representando 30,22% – aqui destaque para a BlackRock, gestora de fundos americana que detém 5% deste total de ações. Os 129.001 acionistas nacionais (minoritários) com 74.027.540, portando sendo 19,47%, o Estado de Minas Gerais com 190.249.612, representando 50,03%, residualmente, as ações em tesouraria, 1.071.639, impactando em 0,28% do total. Notável então, portanto, que devido a ausência de uma política protecionista tal qual aplicada no último mês pela Petrobrás por Lula/Haddad. Ou seja: ao mesmo tempo em que Zema protege o setor leiteiro mineiro, em determinada engenharia financeira, faz com que estrangeiros explorem retiradas e remessas de lucro da água do povo mineiro, criando um paradoxo: por quê então, Zema permite essas retiradas extraordinárias, em especial quando vai para o capital estrangeiro? Por que não permitir isso, criando uma proteção para investimentos maiores, aplicando em tecnologia e capital humano, permitindo avanços no saneamento, tarifas menores para população, redução das terceirizações, quarteirizações e quarteirizações, mais soberania e claro, maior controle do capital financeirizado sobre um elemento tão fundamental que é a água? Permanece portanto perguntas e contradições, afinal, aqui a síntese delas na proposta do artigo presente – Zema, proteger o leite é mais importante que proteger a água?

Lucas Tonaco – secretário de Comunicação da FNU e dirigente do Sindágua-MG