Artigo: Lucas Tonaco*
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O recente caso envolvendo a suspensão de cobrança de pedágio operado pela EPR Triângulo, grupo Equipav – que têm ligações com a AEGEA -, literalmente sediado na Avenida Faria Lima em São Paulo, é a síntese das operações concessionárias no Brasil: além de já pagar os impostos e tributos envolvidos na operação pública, como por exemplo o IPVA, a população acaba tendo que pagar literalmente ainda novamente para a prestação do serviço pelo ente privado.
O pedido por parte do MPMG/MPF, aponta “que houve direcionamento e favorecimento indevido ao consórcio por parte dos servidores responsáveis pela licitação, além de favorecimento e direcionamento, do certame que ocorreria então na B3, acusasse também, de crimes contra a fé pública e a administração pública”, e no dia 15 de Abril de 2024, a justiça concedeu o pedido de suspensão da cobrança – detalhe que além das dúvidas no certame, o que é verificado é que durante a fiscalização do cumprimento do contrato de concessão haveria problemas diversos não solucionados.
Mas e com relação às outras concessões, como as de saneamento em Manaus, Pará de Minas, Ouro Preto, Rio de Janeiro, Alagoas, Águas Guariroba (Mato Grosso do Sul), diversas no Rio Grande do Sul e até no caso mais recente em Governador Valadares, onde após a operação de uma concessão de saneamento privada, começou os problemas foram os mesmos: contrato fora de parâmetros, com preço da água aumentado e a qualidade caindo.
Roga-se, portanto, contra o absurdo, de que, assim como os pedágios, cujos investimentos iniciais sendo as rodovias foram sim feitos massivamente pelo Estado inicialmente – diga-se aqui União, Estado como unidade federativa e até município – especialmente na era Kubitschek e os investimentos rodoviário, tal qual também no “desenvolvimentismo tardio militar” e também no êxodo rural, ou seja, durante muito tempo, quem investiu para prospectar, construir e dar manutenção foi sim o Estado, mas que após o início da década de 80 com o neoliberalismo ferrenho avançando sobre o Brasil e sofrivelmente na década de 90, com força o discurso privatista foi se estabelecendo como modelo de pensamento: “a iniciativa privada é mais eficiente”, a “iniciativa privada administra melhor”, a iniciativa privada possui concorrência” e a “iniciativa privada consegue um preço melhor e mais barato”, são exemplos de falácias as quais não há evidência mas sim interesses profundos em altas taxas de lucro para privatizar direitos públicos e torná-los mera mercadoria tal como também seres humanos em meros clientes.
A suspensão da cobrança pela justiça, é só mais um dos inúmeros indícios de que não, a iniciativa privada não necessariamente têm concorrentes mas sim processos espúrios no capitalismo de compadrio que muitas vezes incide no Brasil, faz com que o jogo seja ganho antes mesmo de ser jogado e no meio de favores e favorecimentos, após de estabelecido, a qualidade cai e o preço sobe, deixando o povo na mais penúria.
É preciso, portanto, que se diga mais uma vez o óbvio – o mesmo aconteceu com o saneamento, onde, no período entre final da década de 60 e início dos anos 70, com Saneamento e do Plano Nacional de Saneamento (PLANASA) dinheiro público foi investido para tudo: construção de barragens de captação, estações de tratamento de água e esgoto, redes de distribuição, estruturação administrativa de companhias de saneamento, contratação de pessoal, qualificação da mão de obra especializada em saneamento e aplicação em engenharia avançada, permitindo que com os não passassem sede e nem morressem de doenças infecciosas ocasionado pelo não tratamento de esgotamento sanitário – ocorre que durante os anos 90 e posteriormente mais agressivamente após a 14.026/20 ,o Novo Marco do Saneamento, foi se estabelecido um discurso de que “o privado promoverá universalização”, esquecendo que apesar das metodologias de cálculo indenizatórias promovidas recentemente pela regulação específica da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), quem investiu inicialmente foi sim o estado e assim permaneceu durante muito tempo, afinal, já é quase que um jargão amplamente sabido popularmente em uma analogia válida: “o privado quer o filé, o estado que fica com o osso”, todo o risco, capital, planejamento e toda a responsabilidade era do Estado, que agora, no discurso privatista, parece esquecer quem foi o responsável pela realização do saneamento no Brasil, que não, não foi a iniciativa privada.
No futuro, é certo o encontro das concessões privadas com a fiscalização, estudos e outras prospecções que demonstrarão o óbvio: água não é mercado e saneamento não deve ser negócio, pois no final das contas, quem paga as contas e geralmente em dobro, como no caso dos pedágios, sempre é o povo.
* Lucas Tonaco – secretário de Comunicação da FNU, dirigente do Sindágua-MG, acadêmico em Antropologia Social e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)