Artigo: Lázaro de Godoy Neto*
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Indicadores econômicos despencam e empresa prioriza pagamentos milionários a empresas terceirizadas e empreiteiras em detrimento de dívidas trabalhistas e de natureza alimentar.
O balanço da Sanesul referente ao ano de 2023, divulgado no último dia 9 de abril, apresenta um cenário preocupante, marcado por indicadores econômicos em queda livre e gestão temerária por parte da empresa. Entre os pontos mais alarmantes, estão o aumento expressivo das despesas com serviços de terceiros, incluindo a polêmica PPP de Esgotamento Sanitário, e a priorização do pagamento de dívidas milionárias a empreiteiras, enquanto dívidas trabalhistas e de natureza alimentar, inclusive de precatórios, são relegadas a segundo plano.
Despesas com terceiros disparam em 33%
Um dos aspectos mais graves do balanço é o aumento exorbitante das despesas com serviços de terceiros, que cresceram 33% entre 2021 e 2023, passando de R$ 238,8 milhões para R$ 317,25 milhões. Esse valor milionário é destinado a empresas terceirizadas, inclusive à PPP de Esgotamento Sanitário, questionada por sua legalidade e onerosidade para o Estado, sem qualquer contrapartida. Basta ver que, a mesma assumiu mais de R$ 1 bilhão de reais de investimentos feitos com recursos não onerosos da União e os investimentos por empréstimos que serão 100% pagos pela estatal. Isso também está demonstrado no Balanço.
Pagamento de dívidas milionárias a empreiteiras
Enquanto isso, a Sanesul prioriza o pagamento de dívidas milionárias a empreiteiras, mesmo existindo diversas ações trabalhistas e de natureza alimentar em atraso. Um caso emblemático é o de uma dívida de R$ 19,8 milhões com uma empreiteira (pág. 38 e 39 do balanço) cujas obras sequer há notícias de sua execução, que foi negociada para pagamento parcelado, com correção anual pelo IPCA, mesmo havendo a possibilidade de quitação com desconto de até 40% através de precatórios, conforme editais publicados anualmente pelo próprio judiciário. Ressalta-se que, a própria estatal recorreu ao Supremo Tribunal Federal (RCL 49563/MS) para que pudesse pagar por precatórios e 5 (cinco) meses depois negociou o pagamento com parcelamento corrigido anualmente.
“ Trata-se de reclamação, com pedido de liminar, ajuizada por Empresa de Saneamento de Mato Grosso do Sul S.A – Sanesul, em face de atos do Juízo da 13ª Vara Cível Residual da Comarca de Campo Grande/MS, no Cumprimento de Sentença nº 0039912-21.2005.8.12.0001 e do Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, nos autos do Processo nº 1410171-89.2021.8.12.0000, que, ao desconsiderarem a aplicação do Regime de Fazenda Pública à reclamante, sociedade de economia mista, prestadora de serviço público essencial e não concorrencial, teriam desrespeitado a autoridade das decisões proferidas por esta Corte nos julgamentos das ADPFs 387, 437 e 556, e também na Reclamação nº 45.615.
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Nesse contexto, esta Casa tem entendido ser a ela aplicável o regime de precatórios às entidades da Administração Indireta prestadoras de serviços públicos essenciais, de modo que, ao não estender à reclamante o benefício de execução atribuído à Fazenda Pública, a decisão reclamada vulnerou o que decidido por esta Corte nos processos paradigmas invocados.” (Ministro Edson Fachin, Relator, Brasilia 24/10/2022)
Prejuízos ao erário e inércia dos órgãos de fiscalização
Essa gestão temerária gera diversos prejuízos ao erário público, como o aumento do passivo trabalhista, que dobrou em 2023, passando de R$ 6,87 milhões para R$ 13,85 milhões. As perdas em processos judiciais cresceram 1.415% (pág. 42 do balanço) de R$2,15 milhões para R$32,7 milhões, se não bastasse, se tem negociação de pagamentos de ações cíveis, de valores milionários. “E, muitas outras ações cíveis e trabalhistas com possibilidades de perdas, por decisões meramente administrativas de gestores e corpo jurídico, que não são responsabilizados”, afirma o presidente do SINDAGUA. Apesar dos resultados negativos, e dos indicadores econômicos financeiros se deterioram a cada ano, não há qualquer manifestação dos órgãos de fiscalização, dos acionistas e do próprio Conselho de Administração da Sanesul.
Dúvidas e questionamentos sobre a gestão da Sanesul
Diante desse cenário, diversos questionamentos surgem:
- Quais os reais interesses por trás da piora dos indicadores da Sanesul?
- Por que a empresa prioriza o pagamento de dívidas milionárias a empreiteiras em detrimento de dívidas trabalhistas e de natureza alimentar?
- Qual o papel dos órgãos de fiscalização e do Conselho de Administração da Sanesul nessa situação?
- Onde estão os investimentos de R$ 400 milhões da PPP de esgotos nesses 3 (três) anos, que não aparecem nos balanços da SANESUL e tampouco da PPP?
- A quem interessa o enriquecimento sem causa através da terceirização de serviços públicos essenciais, que se utilizam de equipamentos e materiais da estatal?
- Como garantir a efetiva responsabilização dos gestores pelos prejuízos ao erário público ou mesmo dos responsáveis por pareceres jurídicos que geram todas essas ações cíveis e trabalhistas?
- Por que será que precatórios no Tribunal Regional do Trabalho e no Tribunal de Justiça que em valores que somados não representam 2% dos valores negociados com empreiteiras, não são pagos?
Papel do Ministério Público Estadual
É fundamental que o Ministério Público Estadual atue com rigor para apurar as irregularidades e responsabilizar os envolvidos. A sociedade sul-mato-grossense tem direito a uma gestão pública transparente, eficiente e comprometida com o bem-estar da população, e não com interesses privados. Não se justifica recorrer ao STF para pagar dívidas de empreiteiras por precatório e meses depois negociam parcelamento com reajustes anuais.
Priorização de dívidas de natureza alimentar e trabalhista
É urgente que a Sanesul revise suas prioridades e priorize o pagamento das dívidas de natureza alimentar e trabalhista, garantindo o direito à saúde e à dignidade dos trabalhadores e da população em geral. “Inclusive, se recorre a pagamentos por precatórios até Ações por descumprimento de cláusulas de Acordo Coletivo de Trabalho”, afirma o presidente do SINDAGUA.
Transparência e combate à impunidade
A sociedade civil organizada também deve se mobilizar para exigir transparência nas contas da Sanesul e o combate à impunidade. É necessário que os responsáveis por esses desmandos sejam responsabilizados e que os recursos públicos sejam utilizados de forma responsável e eficiente, em prol do interesse coletivo.
Fortalecimento dos sindicatos e da luta por direitos
Nesse contexto, o papel dos sindicatos e das entidades representativas dos trabalhadores é crucial para fortalecer a luta por seus direitos e garantir que as leis sejam cumpridas. A união e a mobilização da classe trabalhadora são essenciais para barrar a precarização do trabalho e garantir serviços públicos de qualidade para todos. Caso contrário, os interesses privatistas irão se sobrepor ao interesse público.
Ações conjuntas para garantir serviços públicos de qualidade
Somente através da ação conjunta do Ministério Público Estadual, do Ministério Público Federal (quando envolver recursos da União), da sociedade civil organizada, dos sindicatos e dos órgãos de controle é possível garantir que a Sanesul seja administrada de forma responsável, transparente e comprometida com a prestação de serviços públicos de qualidade para a população de Mato Grosso do Sul. E, que o setor privado não seja beneficiado com regras remuneratórias questionáveis e lesivas a população.
*Lázaro de Godoy Neto, ex-Diretor de Comercial; Administração e Finanças; Engenharia da SANESUL; ex-assessor parlamentar no Senado Federal e atual Diretor Presidente do SINDAGUA-MS.