Lucas Tonaco*
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Em Lavras, município do sul de Minas Gerais, com aproximadamente 100 mil habitantes, a população, trabalhadores e a imagem da COPASA. A etiologia da crise se deu com relação questões de infraestrutura e crise hídrica, porém, ao contrário da expectativa dita de uma empresa que é bilionária mas possui uma arquitetura de investimentos um tanto quanto questionável, principalmente agora com as mudanças de matrizes de risco devido a mudanças regulatórias em algumas cidades, que possivelmente ocasionarão reequilíbrio financeiros cada vez mais agressivos, o que se vê, com muita clareza são recordes de lucros e distribuição para os acionistas, porém, sem pensar duas questões fundamentais.
A primeira delas, é que quão mais se reforça a tese errônea do “Fora COPASA” , conforme se dá pela ausência de planos concretos – para muito além de cronogramas de interrupções – ou excessos de surpresas, a COPASA têm seu capital de imagem arranhando, fazendo com que discursos privatistas no saneamento sejam cada vez mais frequentes, o que em tese, a discussão em si não é ruim, mas, por óbvio, a privatização do saneamento que a saída da COPASA pode significar, sim – e é preciso inclusive uma observação especial a pesquisas, estudos e evidencias internacionais, como as realizadas pelo Transnational Institute (TNI) e o Corporate Europe Observatory (CEO), indicam que a ausência de transparência em processos de privatização tende a favorecer interesses privados, muitas vezes à custa da qualidade do serviço e do bem-estar social, tais estudos demonstram que, em cidades onde o saneamento foi remunicipalizado (835 cidades em 37 países entre 2000 e 2015), a gestão pública garantiu tarifas mais justas e serviços de melhor qualidade, reforçando o argumento que as populações são contrárias aos processos de privatização de saneamento em serviços públicos, não bastasse o vasto arcabouço de estudos produzidos relacionando tal questão internacionalmente, há o que não falta são exemplos de como a privatização do saneamento falhou no Brasil, como citado acima.Mas se as populações são afetadas como neste caso de Lavras, em Minas GErais, como os mecanismos privatistas funcionam em uma perspectiva social? Os mecanismos são muitos e eles seguem tendências diferentes, uma das exposições dos sinais desses fenômenos, conforme o artigo Gramáticas do mercado: a financeirização enquanto interpretatividade de metadiscursos na Antropologia Econômica no caso das privatizações da água no Brasil, é exatamente o que ocorre em Lavras: a retórica da gestão eficiente, que a COPASA falha, do avanço e da dita “modernidade” na administração pública:
“Para que se faça sentido não pensar em coletivização ou ressignificação dos “bens em comum”, ou da agência, detenção e propriedade das mercadorias, os agentes de mercado em sua forma reducionista criam o artifício retórico da privatização como signo necessário a um processo de individualização dos lucros e do prejuízo inteiro dessas populações em detrimento das privatizações seja veiculado midiaticamente é preciso ler os interesses econômicos e políticos que são intrínsecos a essa retórica, especialmente no dito período “neoliberal”, e também como numa interpretação de Appadurai (2008) em relação a cultura e mercadoria serem indissociáveis e na lógica da vida social das coisas e dos signos com interesses também contraditórios para outros significantes, interessados, inclusive.Jornais, programas de televisão, vinculações em redes sociais, são instrumentos para evasão e capilaridade dessas discursividade, então para que a lógica mercadológica faça se permanente é preciso em sentido ‘’evolucionista” de que as privatizações são o futuro, e que o caminha para dita modernidade seja a eficiência na gestão – não é raro essas vinculações entre questões sociotécnicas e econômicas para que se faça acreditar que as agências do dito mercado são portanto uma espécie de solução inescapável tão quanto o discurso do avanço tecnológico” (Ferreira, 2024).
Portanto, é isso – a falta de conhecimento da população sobre saneamento, e sobre os males da privatização, nessas horas, é que são colocadas, como discursos oportunistas e radicais que visam a “modernidade”, mas que no final das contas, são infelizes contradições de um serviço até então instável, pode na verdade ser substituído, em última análise por um muito pior. Precisa-se portanto melhorar questões da comunicação da COPASA, de gerenciamentos de crises e diálogos interinstitucionais e não substituir a COPASA como propõe tal tese radical.
Já os trabalhadores da COPASA, que também sofrem devido a várias intercorrências com o serviço e a operacionalização é que podem ser alvo da representação de uma uma raiva social contra a COPASA. Vejamos bem, a COPASA existe em como um ente abstrato em sua imagem, mas se materializa na camisa azul de cada trabalhador. Conforme dito no artigo no meio de uma crise climática, COPASA têm obrigação de atender todos os itens do Acordo Coletivo, os trabalhadores também são vítimas deste processo ao mesmo tempo em que são parte de sua solução:
Ocorre que, conforme constatado, além do baixo nível das fontes de abastecimento, chegando a afetar distribuição regular, as dezenas de problemas se estabelecem: além da oferta de água ser afetadas, no calor pessoas, por óbvio, tendem a consumir mais água, tanto em seu uso direto, como também em equipamentos de refrigeração como ar condicionados e equipamentos que dissipação, tornando uma espécie de tempestade perfeita: crise na oferta e a aumento na demanda, fazendo ficar difícil a previsão inclusive geográfica desse consumo, que não é tão cartesiana quanto parece. Todos os trabalhadores da COPASA acabam trabalhando mais, e com mais estresse, operadores e técnicos nas rotinas diárias e na manutenção trabalham mais por lidam com situação de anormalidade nas redes de de distribuição, bombas, estações de tratamentos, atendentes também recebem mais reclamações devido às instabilidades na oferta, leituras caminham em um sol escaldante sob um ar de fumaça advindas das queimadas, todo o administrativo, portanto, têm sua carga de trabalho também aumentada, consequência das rotinas burocráticas lidarem com anormalidades de todos os outros setores que a empresa enfrenta. Se água acaba sendo um recurso tão lembrado – ou o mais lembrado – nos tempos de crise climática devido a sua essencialidade na vida humana, os trabalhadores que lutam todos os dias para que uma sociedade não tenha sede ou passe por necessidade hídricas, merce ser no mínimo respeitada, afinal, os trabalhadores copasianos não medem esforços para que isso aconteça – trabalham sol a sol, em condições muitas vezes exaustiva, muitas vezes quase sem reconhecimento social, o neste caso, o que ocorre é o contrário, a sociedade, por vezes intolerante e não compreendendo a situação tende a difamar a empresa, e as camisas azuis na rua, mesmo com todo o esforço necessário, sendo a imagem da empresa mais próxima das pessoas, copasianos acabam sendo atingidos, principalmente psicologicamente.
A conclusão é que a população é vítima muitas vezes de uma alta política de engenharia financeira que danifica sua imagem, encontrando uma população vulnerável e impaciente – e com razão – pois água é um direito fundamental essencial, para além de uma simples commodity, tal povo se vê desinformado sobre a opção ruim que é a saída da COPASA mas passa a defender com mais radicalidade. No meio deste processo todo de altos dividendos e de financeirização do saneamento, está o trabalhador da COPASA de Lavras, que se vê hostilizado e por vezes impotente para lidar com questões tão difíceis, mas que no final da crise serão eles próprios os responsáveis para a promoção de uma solução.
* Lucas Tonaco – secretário de Comunicação da FNU, dirigente do Sindágua-MG, acadêmico em Antropologia Social e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)