MP perde validade dia 23 de abril, caso não seja votada pelo Congresso. Depois dessa data, passará a valer a Lei 13.467, sem mudanças. Segundo o jornal Valor Econômico, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), encaminhou ofício afirmando que a comissão mista tem até esta terça-feira (3/4) para aprovar um relatório. Caso contrário, não pautará mais o tema. A comissão não tem presidente e nem agenda marcada.
O risco de a medida provisória (MP) que modificou pontos da reforma trabalhista perder a validade a partir do dia 23 de abril deixa uma série de dúvidas no ar. Com as mudanças em vigência ainda sendo interpretadas por advogados, magistrados, sindicatos, empregadores e trabalhadores, uma nova alteração nas regras criaria um cenário de insegurança jurídica.
A MP 808 alterou 17 artigos da reforma trabalhista (Lei 13.467). Caso caduque, sem ser votada pelo Congresso Nacional, todas as mudanças e ajustes sob a reforma perderiam o efeito. Significa que voltariam a valer, da forma como foram aprovadas em julho do ano passado, as novas regras para as relações de trabalho.
– Não volta a valer a CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) original, de antes da reforma trabalhista. Volta a valer o texto da reforma original. O problema é que a MP 808 é extremamente complexa. Se cair, será uma bagunça, um cenário de completa insegurança jurídica. O que deveria ser algo bom se transformará em um problema – projeta o desembargador do Tribunal Regional do Trabalho (TRT-RS) e professor da Faculdade de Direito da UFRGS, Francisco Rossal de Araújo.
Integrante da Comissão de Jurisprudência do TRT, o magistrado participa de um esforço para evitar que duas turmas do tribunal decidam de forma diferente um mesmo assunto, até mesmo indo ao interior do Estado se em uma cidade houver dois juízes com entendimentos opostos sobre um mesmo tema. Uma luta diária, segundo ele, para criar segurança jurídica que beneficie tanto trabalhadores quanto empregadores. É esse esforço que o desembargador vê sob ameaça com a queda da MP.
Interpretações sobre os contratos vigentes
Um dos artigos da MP 808 é decisivo para a aplicação de toda a Lei 13.467. Trata-se do artigo 2º, definindo que a reforma trabalhista se aplica a todos os contratos vigentes, independente de quando foram firmados. Sem a medida provisória, volta a discussão sobre a reforma se aplicar somente a contratos firmados após novembro do ano passado, quando entrou em vigor a reforma.
– Esse artigo é, talvez, um dos mais importantes da MP 808 porque firma as bases para algo que chamamos de aplicação intertemporal, como se aplica a lei aos contratos em curso. Sem a MP, cada tribunal vai interpretar de um jeito. Até o TST (Tribunal Superior do Trabalho) unificar esse tempo pode levar cinco anos – prevê o magistrado.
A MP 808 altera pontos da reforma trabalhista que tratam de trabalho intermitente, condições de atuação de grávidas e lactantes e jornada de 12 por 36 horas. O texto conta, até agora, com 967 emendas parlamentares propondo novas modificações. Confira, abaixo, as principais mudanças trazidas pela Medida Provisória e como fica a CLT sem ela.
Os principais pontos modificados pela MP 808
Vigência da reforma
Com a MP: a Lei 13.467 se aplica, na integralidade, a todos os contratos de trabalho vigentes.
Sem a MP: sem definição explícita, a tendência é de que cada tribunal interprete a vigência de uma forma diferente à medida que ações ingressem na Justiça. O Tribunal Superior do Trabalho (TST) deverá unificar o tema, mas isso leva alguns anos.
Contrato 12 por 36 horas
Com a MP: não há possibilidade de se estabelecer essa jornada – 12 horas de trabalho seguidas por 36 horas seguidas de descanso – por acordo individual. Só pode ser definida por convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho. A MP acrescenta uma exceção: entidades da área da saúde podem firmar essa jornada por acordo individual escrito.
Sem a MP: volta a valer a Lei 13.467, com essa jornada podendo ser estabelecida por acordo individual escrito, convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho. E se torna válida para todas as categorias.
Antes da reforma: não havia regulamentação para essa jornada na lei trabalhista. Era considerada válida em caráter excepcional, para algumas categorias, desde que definida por meio de convenção ou acordo coletivo.
Trabalho de autônomos
Com a MP: proibido firmar contrato com cláusula de exclusividade. Trabalhar como autônomo para apenas uma empresa segue não gerando vínculo empregatício. Mesmo motoristas, representantes comerciais, corretores de imóveis e trabalhadores regulados por leis específicas não serão considerados empregados se atuarem como autônomos para apenas um empregador.
Sem a MP: a contratação de um profissional autônomo, mesmo prestando serviços de forma exclusiva, não o tornaria empregado pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Mas volta a existir a possibilidade de cláusula de exclusividade, não há proibição explícita na reforma trabalhista.
Antes da reforma: não havia previsão específica na legislação trabalhista sobre o autônomo. Mas a atuação contínua para um empregador poderia ser reconhecida, na Justiça, como prova de vínculo empregatício.
Grávidas e lactantes
Com MP: a gestante será afastada de locais insalubres e não receberá o pagamento de adicional de insalubridade. Ela só poderá atuar em locais insalubres em graus médio ou mínimo quando, voluntariamente, apresentar atestado de saúde dando esta autorização. A MP segue a recomendação prevista pela reforma: mulheres que estão amamentando serão afastadas de atividades insalubres, em qualquer grau, quando apresentarem atestado recomendando isso.
Sem a MP: a gestante só deve ser afastada, obrigatoriamente, de atividades insalubres de grau máximo. Para as gestantes que exerciam atividades insalubres em graus médio ou mínimo, o afastamento só acontece quando um médico de confiança recomendar por meio de atestado. Para as lactantes, em qualquer atividade insalubre, o afastamento ocorre por atestado médico. Gestante e lactante, se afastadas, não perdem o adicional de insalubridade.
Antes da reforma: a empregada gestante ou que estivesse amamentando deveria ser afastada durante toda a gestação e a lactação de qualquer atividade ou local insalubre, devendo exercer atividades em outro local da empresa.
Indenização por dano moral
Com a MP: a indenização segue tabelada, mas não está ligada ao salário do prejudicado. O valor a ser pago pode variar entre 3 e 50 vezes o equivalente ao teto dos benefícios pagos pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), R$ 5.645,80 em 2018. O valor é calculado conforme a gravidade do dano sofrido.
Sem a MP: volta a indenização vinculada ao salário do trabalhador prejudicado. De acordo com o grau do dano sofrido, o juiz pode definir indenização entre 3 e 50 vezes o último vencimento do empregado.
Antes da reforma: o valor de eventuais indenizações era atribuído de acordo com o convencimento do magistrado, tendo como base o Código Civil. Não havia definição sobre isso na lei trabalhista.
Trabalho intermitente (prestação de serviços esporádica, com alternância de períodos de trabalho e de inatividade)
Com a MP: estabelece quarentena de 18 meses entre a demissão de um empregado com carteira de trabalho assinada e a sua contratação para prestação de serviço como intermitente para o mesmo empregador. Esta regra vale até 2020. Depois disso, termina a exigência da quarentena. Entre outros itens, a MP impede-se que o trabalhador intermitente tenha acesso a seguro-desemprego entre a rescisão de um contrato e o início de outro.
Sem a MP: Mas não existe mais a quarentena, abrindo a possibilidade de migração imediata de empregados demitidos para a condição de intermitentes. O trabalhador deve ser convocado para a prestação de serviços com, pelo menos, três dias corridos de antecedência e poderá atuar para outros empregadores.
Antes da reforma: não existia na lei trabalhista esse tipo de contrato de trabalho.
Gorjeta
Com a MP: voltaram a valer regras sobre a gorjeta que estavam na Lei 13.419, a Lei da Gorjeta, que entrou em vigor em maio de 2017. Entre elas, a que determina que empresas anotem na carteira de trabalho o salário fixo e a média das gorjetas dos últimos 12 meses. Também a garantia da gorjeta como dinheiro dos empregados e a multa para o empregador que descumprir a regra de 1/30 avos da média da gorjeta por dia de atraso, limitado ao piso da categoria: para um empregado que ganhe, em média, R$ 200 de gorjeta, a multa diária devida pelo empregador será de R$ 6,66 por dia.
Sem a MP: a reforma volta a retirar parágrafos da Lei da Gorjeta (Lei 13.419) introduzidos na CLT, como o que garantia esse dinheiro aos empregados, com distribuição e rateios definidos por convenção ou acordo coletivo. Legalmente, a gorjeta volta à situação anterior a maio de 2017.
Antes da reforma: não havia uma regra geral sobre o tema na CLT até a chegada da Lei da Gorjeta. Esse texto definiu como teria de ser o rateio da cobrança em bares, restaurantes, hotéis, motéis e estabelecimentos similares. (fonte: GaúchoZH)