Até os escribas do governo jogaram a toalha e reconhecem que não virá a “retomada” do crescimento. Mas os ratos não abandonaram o navio
artigo – Lindbergh Farias*
O plano econômico do golpe, que atende pelo nome fantasia “A ponte para o futuro”, fracassou.
O governo mentiu. Por isso, cai pelas tabelas no quesito popularidade. O ex-ministro e presidenciável Henrique Meirelles, por exemplo, mentiu ao dizer que a reforma trabalhista geraria dez milhões de empregos.
Passados seis meses de vigência da reforma, o desemprego alcançou 13,1% no primeiro trimestre do ano —astronômicos 13,7 milhões de brasileiros desempregados.
Mesmo considerando a sazonalidade do período, os dados revelam a incapacidade de a economia reagir e gerar emprego.
Não há retomada consistente da economia, que caiu num perigoso estágio de estagnação. Do fundo do poço não vai sair devido ao fracasso do governo golpista em inaugurar um ciclo de crescimento.
O governo Temer desmontou mecanismos de política anticíclica de saída da crise. Para o país voltar a crescer e reduzir desigualdades, é necessária a revogação do teto de gastos. O arrocho fiscal, fortíssimo este ano, será ampliado em 2019.
Segundo dados do PLDO (Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias), investimentos e custeio do Estado representarão 3,09% do PIB em 2019, pior desempenho desde 1997.
É hora de mudar a política econômica. Até os escribas do governo jogaram a toalha e reconhecem que não virá a “retomada” do crescimento. Mas os ratos não abandonaram o navio. A jogatina da hora é a privatização da Eletrobras. Esta seria a mais escandalosa privatização de todos os tempos.
O então presidente Lula retirou a Eletrobras do PND (Programa Nacional de Desestatização) em 2004. Temer pretende reincluir a privatização na agenda, tendo editado decreto inconstitucional, pois inclui a Eletrobras no PND, mesmo sem aprovação do PL de privatização pelo Congresso Nacional.
Há uma expectativa de arrecadação de R$ 12 bilhões, em função da previsão de que a empresa poderá retirar 14GW do regime de cotas, vendendo energia a um custo até cinco vezes maior.
O valor arrecadado será irrisório, ante estimativa de R$ 370 bilhões para o parque gerador da Eletrobras e os custos para o consumidor. A Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) prevê que as tarifas poderão subir até 16,7% com a descotização.
Pesquisa na Inglaterra, publicada no jornal The Guardian, constata que 83% da população são favoráveis à nacionalização da água e 77% da eletricidade. Nos principais países do mundo, as usinas hidrelétricas são controladas pelo Estado (por exemplo, China, França, Noruega, EUA, Canadá).
O PND completou 21 anos. Um balanço sério demonstra que as privatizações foram um grande desastre de destruição não criativa. Deu-se uma mera transferência de patrimônio público para o setor privado.
Entre a década de 1990 e 2002, o Estado vendeu grande parte de seu patrimônio, mas a dívida líquida do setor público dobrou, subindo de 30% do PIB em 1994 para 60% do PIB em 2002.
As estatais privatizadas se mostraram ambientalmente predatórias. O mais trágico emblema foi o desastre ambiental do rio Doce pelos rejeitos de minério da Samarco (joint venture controlada pela Vale e BHP Billiton).
Não há dados que atestem a relação entre privatização e redução de preços. A Celg-D, distribuidora de energia elétrica em Goiás, foi privatizada em 2017 e, na sequência, houve reajuste de quase 16% na tarifa residencial, para uma inflação menor do que 3%.
Diante do modelo apresentado pelo governo, uma Eletrobras privatizada, seguramente, acarretará aumento de tarifa. Por tudo isso, parlamentares devem cerrar fileiras com os interesses populares, dizendo não à privatização da Eletrobras.
* Lindbergh Farias – Senador (PT-RJ) desde 2011, foi deputado federal (1995-2004) e prefeito de Nova Iguaçu (2005-2010)
Artigo originalmente publicado na Folha de S. Paulo – 9/5/18