Lucas Tonaco*
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O  Instituto Trata Brasil, constatou o óbvio: o Novo Marco do Saneamento não resolveu, não resolve e nem resolverá o problema da universalização, segundo o estudo, “O cenário atual é precário: cerca de 32 milhões de brasileiros vivem sem acesso à água potável e mais de 90 milhões não têm coleta de esgoto. A lei estabeleceu que todas as localidades brasileiras devem atender a 99% da população com abastecimento de água e 90% com esgotamento sanitário até 2033, ressaltando que será necessário mais de 500 bilhões de reais de investimento. Conforme já citado no artigo “A famigerada alteração na filosofia de cálculos da norma de regulação (NR) da ANA e o futuro do saneamento no Brasil”, a celeuma dos bilhões de investimentos eram na verdade um processo muito arriscado para substituição de investimentos públicos por investimentos privados – mas que no final acaba mesmo com financiamento público, via BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento) ou com aumento de tarifas, deixando o capital quase sem risco – em um setor extremamente sensível com relação a três variáveis econômicas sensíveis:

1) O tempo, afinal, são contratos de longo prazo (35 anos), payback e ritmo de investimentos para universalização até 2033 freneticamente irrealizáveis, conforme constatação do próprio Trata Brasil.

2) Investimentos de fundos de pensão/private equity bastante sensíveis a cenários internacionais, inserindo por aí a complexidade das taxa de juros nos Estados Unidos, Europa e no cenário interno, principalmente, e com isso toda uma instabilidade da garantia de investimentos.

3) Regulação um tanto quanto incerta: desde os Decretos n.º 11.598/2023 e n.º 11.599/2023, mudança em NRs da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), nas agências regionais de regulação e até insegurança jurídica com um timing jurídico, político e econômico em assincronia.

Mesmo que há ainda várias outras variáveis que explicam porquê a universalização não poderia ser feita até 2033 conforme as promessas irreais da 14.026 em 2020, o que se conclui, até então é:

1) As taxas de universalização nas empresas públicas ou mistas de saneamento, seguiram a tendência de alta, ou a manutenção para o alvo de 2033, onde provavelmente, no atual cronograma, haverá atingido o centro da meta ou perifericamente bem próximo.

2) As assimetrias regionais continuam, aliás, em alguns pontos se agravam, mostrando que as iniciativas de flexibilização para atratividade do setor privado, foi um fracasso, afinal, como dito obviamente anteriormente durante o processo de aprovação da 14.026/2020 a iniciativa privada tenderia, em absoluto, a áreas lucrativas onde corretamente já eram áreas universalizadas. Regiões vulneráveis economicamente, como norte e nordeste do país, não haveria investimentos ou atração tão massiva a ponto de justificar a flexibilidade na lei, como já acontece por exemplo em Manaus, onde há anos privatizado, está entre um dos piores índices de saneamento do Brasil, Saneatins no Tocatins seu colapso ou mesmo a BRK em Alagoas, que lidera o número de reclamações no PROCON. A iniciativa privada também não resolveu investir dois gargalos essenciais na universalização: saneamento rural e políticas específicas de assimetria no acesso a saneamento, como questões socioeconômicas ou até mesmo de gênero.

Assim como nos casos citados acima, a análise mostra que números altíssimos da necessidade de investimentos  para atrair o setor privado, flexibilidade na regulação,  mecanismos que resultaram em privatização e todo um discurso sobre o setor privado no saneamento, se mostraram mesmo é ineficazes para resolver o problema da universalização como prometido pelo Novo Marco do Saneamento, aliás, o que ocorreu mesmo foi o contrário: demissões em massa em empresas privatizadas, salários baixos para os trabalhadores em saneamento e contas mais cara para população, gerando cada vez mais desigualdade. Portanto, a conclusão é óbvia – a única saída possível para universalização do saneamento, combate a desigualdade, tarifas mais baixas e trabalhadores do setor mais bem valorizados, é o investimento público, e este, inclusive foi quem fez a maioria absoluta do saneamento no Brasil, é necessário agora um combate comparativo e análises de como iniciativas neoliberais como o Novo Marco do Saneamento são um equívoco tão absurdo que não há ganhadores nele, a não ser para banqueiros e mercado financeiro, inclusive estes principalmente os estrangeiros.

Lucas Tonaco – secretário de Comunicação da FNU, dirigente do Sindágua-MG, acadêmico em Antropologia Social e Ciências Humanas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)