A decisão do governo de aprovar o leilão de seis distribuidoras de energia da Eletrobras, anunciada na última sexta-feira, pode ter sido tomada em um momento nada favorável e influenciar negativamente no preço que se pretende obter com a venda das companhias. A avaliação dos economistas é de que, apesar de a venda ser necessária, perdeu-se o melhor momento. Agora, além do agravamento da crise política, o país passa por dificuldades em sua agenda econômica, especialmente na questão cambial.
A apresentação das propostas junto à B3 está agendada para 26 de julho, mas pode sofrer mudanças, caso o governo não consiga uma série de aprovações para cumprir os trâmites legais. O edital já está disponível no BNDES. Segundo o edital de licitação, juntas as empresas acumulam prejuízo de R$ 15,436 bilhões em cinco anos até 2016. Serão vendidas as distribuidoras Amazonas Energia (AM), Ceron (RO), Ceal (AL), Boa Vista Energia (RR) e Eletroacre (AC).
Favorável às privatizações, Sérgio Vale, economista da MB Associados, avalia que o governo terá problemas ao optar por fazer a venda no meio do que ele chama de ‘turbulência’ cambial e política. “Com poucos interessados, o leilão pode ‘micar’”, avalia. A decisão, segundo ele, deveria ter sido tomada antes. “Agora o país está quase parado e o grau de incertezas é muito grande. O resultado pode ser muito aquém do que se poderia obter sob outras condições”, explica.
O edital prevê que poderão participar do leilão empresas nacionais e estrangeiras, instituições financeiras, fundos de investimento em participações (FIPs), além de entidade de previdência complementar – por meio de consórcio ou individualmente. O valor mínimo determinado pelo BNDES é de R$ 50 mil, já que a Eletrobras, presidida por Wilson Ferreira Junior, terá de elevar o capital social das distribuidoras para tornar o processo viável.
Estatizantes
Segundo o economista da MB Associados, além da crise política e das dificuldades na economia, os investidores podem ter receio de participar do leilão das distribuidoras por causa do atual cenário pré-eleitoral. Ele lembra que dois dos candidatos com mais intenções de voto nas pesquisas, Jair Bolsonaro e Ciro Gomes, são estatizantes. Com isso, há o temor de que o processo de privatização da Eletrobras não avance no novo governo e de que seja adotada uma política intervencionista na companhia. “Esse já é um setor escaldado com medidas de governos anteriores e pode ficar receoso de entrar mais pesadamente sem saber o que vai acontecer. Esses leilões deveriam ter acontecido antes”, acrescenta Vale.
Assim como Vale, André Perfeito, economista-chefe da Spinellii Corretora, também avalia que o cenário eleitoral poderá pesar negativamente na decisão dos investidores por arrematar as distribuidoras. “Ciro Gomes já disse que é contra a venda da Eletrobras. Já Bolsonaro e Marina Silva são duas pessoas sem muita capacidade de articulação política. Fica difícil imaginar que eles consigam aprovar o leilão da Eletrobras”, afirma.
Perfeito avalia que este não seja um bom momento para o leilão das distribuidoras. “O Brasil está muito malvisto e com tudo que está acontecendo é de se esperar que as empresas sejam vendidas por um valor baixo. O governo vai vender um patrimônio público de graça e só tomou essa decisão agora para criar factoides, diante de tantos problemas, como o câmbio, para ganhar tempo”, critica o economista.
Apesar de acreditar que o momento não é o melhor para o leilão, o economista da Órama, Alexandre Espírito Santo, diz que esse pode ser um sinal que o governo dá ao mercado de que não está inerte. “O governo está acuado por uma série de fatores, como a pressão cambial. Diante disso, é preciso buscar o que é menos ruim para o momento. ”, explica.
O economista da Órama acha difícil que o leilão consiga atingir bons resultados financeiros para os cofres públicos. “Não são ativos extremamente atraentes porque se trata de empresas que demandam investimentos pesadíssimos. Racionalmente, quem decidir botar dinheiro no negócio vai ter de encontrar um desconto bem alto”, diz Espírito Santo.
Roberto Padovani, economista-chefe do Banco Votorantim, também acredita que a decisão de leiloar as distribuidoras agora foi a melhor para o momento. “Um momento ideal talvez não chegue nunca. O governo precisa fazer a agenda caminhar, independentemente do desafio fiscal enorme que tem nas mãos”, afirma. Para ele, esse tipo de negócio tem como característica atrair investimentos de longo prazo, por isso pode ser que os problemas políticos e econômicos tenham um peso menor na equação.
O ativo mais atraente, segundo Paulo Cunha, consultor da FGV Energia, é a da Ceal, de Alagoas, que tem um negócio mais estruturado em relação às outras distribuidoras. Para o especialista, o interesse dos investidores vai depender muito da modelagem para o setor que for aprovada no Congresso Nacional. “Mas esses ativos, de uma forma geral, têm como atrativo o potencial de melhoria, que é muito grande. Com habilidade e expertise é possível melhorar bastante o desempenho dessas empresas”, diz.
No negócio de distribuição de energia, que no Brasil passa por processo de consolidação, depende da proximidade entre as operações para aumentar os ganhos com escala. Com a falta de ativos disponíveis, uma alternativa para as operadoras desse setor é justamente crescer e melhorar resultados por meio de aquisições, explica o consultor da FGV Energia.
Por outro lado, no caso das distribuidoras da Eletrobras, os investidores precisarão ter fôlego financeiro para reequipar as operações, montar equipes e renegociar dívidas com o objetivo de melhorar o desempenho. “Por isso, esse deve ser o tipo de ativo que fará mais sentido para quem já atua no segmento, não para investidores”, afirma Cunha.
Fonte: Correio Braziliense